Falsidade: (não) aprenda como lidar
Gastar energia com pessoas falsas é como regar flores de plástico
Não vou cair na tentação de me referir à falsidade como se — exceto eu, que escrevo, e você, que lê — só o outro pudesse ser falso, porque seria exatamente essa a postura de uma pessoa falsa, afinal, se alguém se apresentasse falso de forma verdadeira (“Olá, sou fulano e sou falso, tenha cuidado comigo”), esse alguém seria verdadeiro, e não falso.
Olhando para qualquer atitude dissimulada, não fosse a falsidade, ninguém mais prepararia festa surpresa e a autoestima baseada em elogios estaria com os dias contados, pensando em situações triviais como quando quem lhe parece feio pergunta se está bonito ou um ruim de cozinha para o seu gosto quer saber, esforçado, se o prato ficou bom.
Também há algo de falso em alguém que está no armário. Quando por autoproteção e incapacidade de se aceitar, ok, é um processo, mas quando ocupar o móvel é uma decisão conveniente para sustentar uma relação de fachada ao mesmo tempo que, extraconjugal, desfruta-se de clandestinas relações homossexuais, é mau-caratismo com o parceiro enganado.
A motivação para um ato falso, que pode ser circunstancial ou sistemático, por despreparo ou cinismo, dilema ou trapaça, além de outras bifurcações, resulta ou não na pessoa merecedora do adjetivo falsa, já que se torna um traço marcante de personalidade. E se você a identifica na comparação entre discurso e prática, fuja.
O que fazer
Passei um longo tempo incomodado com a ideia de conviver com uma pessoa que, para mim, merecia o título de falsa, porque aposta neste rebaixado método existencial para obter vantagens materiais detonando os demais pelas costas. Mas de que adianta adquirir lucros ao preço de perder valor?
Então fiquei indignado. Primeiro, tentando desmascarar a pessoa, e aquilo foi virando uma missão cansativa que me esgotava. Depois, não podendo com o inimigo, me juntei a ele no sentido de me apresentar-me falso como o vejo, até me sentir degenerado e recuar da tentativa de ser cínico com quem assim me é.
Resolvi não fazer nada com a pessoa falsa. Nada. Não me comprometer a descortiná-la, não buscar compreender seu tipo de formação psíquica, não retrucar com falsidade gêmea, em queda de braço, não me vincular a ela, deu no saco!
Obrigado ao convívio, olho com cara de paisagem para aquele arranjo de plástico, sem aguar as flores artificiais para extrair dali perfume ou crescimento, pois seria infértil. Aos que se convencem de que aquela bondade cenográfica é genuína, recebam meu cansaço, minha indisposição para dissuadi-los, fodam-se para lá.
A falsidade como estilo de vida não permite a orientação ética, e na falta dessa noção, o outro é enxergado como objeto de manipulação. O falso não respeita o próximo porque a sua consciência está morta.
🧻 ✍🏼 Siga Dou Minha Palavra no Instagram